Data: agosto 29, 2013 | 20:11
TESTIMONIOS | A história da piscicultura acreana começa em 1979, com a inauguração da Estação de Piscicultura do Acre, no governo de Geraldo Mesquita...

A FASCINANTE HISTÓRIA DA PISCICULTURA ACREANA

O Complexo de Piscicultura marca uma nova era no setor acreano, mas os investimentos começaram nos anos 80. | Foto Gleilson Miranda | ANA

Com a recente entrega da primeira etapa do Complexo de Piscicultura do Acre, numa cerimônia que contou com milhares de produtores rurais, o governador Tião Viana e o ex-presidente Lula, começa um novo tempo na piscicultura estadual, que deverá revolucionar a produção rural do Acre e elevar a qualidade de vida de pequenos produtores, num projeto ousado que atende todos os campos do setor. Mas a história da piscicultura acreana é maior. Com investimentos oficiais desde o fim dos anos 70, esse é um caminho longo, com momentos únicos e personagens próprios…

© Samuel Bryan e Jaqueline Teles| Agência Notícias do Acre

A história da piscicultura acreana começa em 1979, com a inauguração da Estação de Piscicultura do Acre, no governo de Geraldo Mesquita, mas foi mesmo inaugurada em setembro. Sua produção de alevinos só começou em dezembro, e a um ritmo muito fraco. Em seu primeiro ano, o centro só foi capaz de produzir dois mil alevinos, um número irrisório. Foi então que um pernambucano chegou ao Acre para mudar esse quadro, o engenheiro de pesca Júlio Resende.

Assumindo a estação em fevereiro de 1980, Resende conseguiu fazer a produção saltar. Em 1981, com a aquisição de espécies exóticas de peixes no Acre, a produção anual de alevinos saltou para 30 mil, e a partir de 1985 foram dois milhões por ano. “Em 1980 deveria haver apenas mil açudes no Acre, todos sem peixe, e cerca de 50 produtores. Hoje existem uns cinco mil açudes e a produção anual é de seis mil toneladas”, explica Resende, que brinca: “Peixe é um lucro garantido na vida do produtor rural. Quem decide que não vai dar lucro ou é Deus ou são os ladrões de peixe”.

Foi Júlio Resende quem ajudou a trazer o peixe que seria um dos maiores sucessos na piscicultura acreana: o tambaqui. E foi Wildy Viana, ainda quando era deputado federal, quem autorizou a importação dos tambaquis e lutou por novos investimentos. Esses primeiros alevinos foram trazidos de São Paulo e se adaptaram tão bem aos tanques acreanos que começaram a desovar em dois anos e meio, em vez de três anos, o tempo padrão.

A Estação de Piscicultura do Acre produziu no seu primeiro ano apenas 2 mil alevinos. | Foto acervo pessoal

A história viva

Falar sobre reprodução de alevinos no Acre é lembrar-se de Wildy Viana, hoje com 84 anos. Foi ele que, ainda na década de 80, trouxe do interior de São Paulo oito mil alevinos de tambaqui. “Naquela época me chamavam de louco, me criticavam. Como eu estava trazendo peixe da Amazônia para a Amazônia?, questionavam. Eles não entendiam que era impossível capturar alevinos de tambaqui nos rios do Acre, ou até mesmo capturar matrizes para reproduzir aqui”, relembra.

Foi abusando da ousadia que Wildy Viana conseguiu com a Aeronáutica, em Brasília, um avião Bandeirante para trazer os oito mil alevinos, que foram criados na Estação de Piscicultura do Acre. As larvas cresceram, e meses depois alguns daqueles alevinos se transformaram em matrizes. Wildy ainda guarda diversos álbuns de fotografias nos quais mostra a reprodução dos alevinos, uma atividade totalmente artesanal. “A única coisa moderna que tinha naquela época era uma injeção que se aplicava nas matrizes para estimular a saída da ova [óvulos] e o sêmen”, afirma.

Geraldo Bernadino (centro) ao lado de Wildy Viana e outros técnicos da Estação. | Foto acervo pessoal

Nas fotos se observa que o trabalho era mesmo manual. Os técnicos usavam vasilhas como panelas e tachos para fazer a fecundação dos óvulos. Mas, como tudo que é pioneiro enfrenta mais dificuldade, ele comenta que naquela época as pessoas eram muito descrentes. “Ninguém acreditava que aquilo poderia dar certo, mas quem apostou, ganhou. O «Japonês», lá do Bujari, foi um que acreditou e está aí para contar a história”, conta Wildy.

Salto na produção

Geraldo Bernadino também foi um dos responsáveis técnicos por engrenar a produção no Estado junto com Júlio Resende. Trabalhando hoje com piscicultura para o governo do Amazonas, ele diz que: “Estive aqui há 30 anos. Estou muito feliz por essa homenagem. Quando estive aqui vim para o trabalho de reprodução de alevinos de tambaqui com o Júlio. Agora, esse é um novo momento, em que o produtor passa a ser protagonista da história”.

Wildy Viana com os primeiros tambaquis. | Foto acervo pessoal

A piscicultura é uma das atividades que mais cresce em termos percentuais no Acre. Hoje são produzidos cerca de 10 milhões de alevinos por ano em todo o Estado, vindos de dez produtores. E Júlio Resende ainda faz parte desse número mesmo aposentado. Em 1995 ele fundou, com o irmão, a Piscicultura Nordeste, que vende alevinos para todo o Acre, conseguindo produzir o ano inteiro.

E se a produção de pescado em 1980 era de 50 toneladas por ano e hoje é de seis mil toneladas, o salto que está marcado é muito maior. O Complexo de Piscicultura produzirá alevinos para gerar 20 mil toneladas de peixe por ano e ração para alimentar 20 mil toneladas de pescado, com um frigorífico capaz de processar toda a produção.

Para Júlio Resende, o governador Tião Viana foi muito inteligente ao atuar em todos os elos da cadeia – desde os alevinos até a filetagem. Hoje os produtores pagam um alto preço pela ração de peixes, e com o complexo esperamos preços melhores. Além disso, haverá uma diversidade na venda do produto com a fábrica de filetagem”, comemora. A produção acreana abastece o Estado e vende para a Bolívia, o Peru e Rondônia. A ideia é expandir o mercado ainda mais com a conclusão desse que será o complexo de piscicultura mais moderno do país.

Júlio Resende hoje tem seu próprio negócio de produção e venda de alevinos. | Foto Gleilson Miranda

Apostou e venceu

Na Fazenda São Raimundo, localizada na Estrada do Quixadá, encontramos aquela que hoje é conhecida como uma das maiores propriedades que investem em piscicultura no Estado. Ivan de Souza é seu proprietário e sua história é um exemplo de perseverança, visão e empreendedorismo. O projeto de piscicultura começou em 1985, quando, «com a cara e a coragem», fez um empréstimo de 10 milhões de cruzados (moeda da época) no banco para investir na criação de peixe, para desespero da família. Mas o tempo passou, e hoje a renda de Ivan é de R$ 700 mil por ano, com 100 toneladas de pescado anual e planos de aumentar seus negócios.

Ivan tem algumas cabeças de gado, mas são poucas, e afirma que seu principal negócio é a piscicultura. “O boi só devasta. O peixe é sensacional. E aqui nas minhas terras eu tenho um potencial hídrico enorme, água de qualidade”, explica o piscicultor, que viajou para diversos lugares para entender as técnicas de manejo da pesca e cujos pirarucus já foram capa da revista Globo Rural. Hoje, além da engorda de peixe, o produtor construiu um “laboratório” – espaço para tanques de reprodução dos peixes e criação de alevinos. “Eu tinha passado no vestibular para Direito em 1985. Recusei fazer e investi no meu sonho de verdade. Piscicultura é uma faculdade em que você nunca se forma. Cada dia tem uma novidade”, declara.

Sem ampliar o espaço para gado, a área fechada nas terras de Ivan são utilizadas tanto pela Universidade Federal do Acre (Ufac) para pesquisa e aulas de campo como operações de treinamento do Exército Brasileiro, com o qual o fazendeiro mantém uma estreita relação. Ivan planeja construir mais 100 tanques este ano com o apoio do governo, que também o auxiliou tecnicamente no laboratório de alevinos. Quando indagado sobre o caminho para sair do pouco e chegar a tanto, Ivan é enfático: “Tu tem que ser honesto e trabalhador. Esse é o único segredo do sucesso”.

Ivan Souza apostou na piscicultura e hoje tem uma gigantesca produção. | Foto Angela Peres | ANA

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